Tirei o título dessa postagem de um livro que li tempos atrás... Ser mãe é quase uma predestinação minha, sempre um sonho. Olhando pra trás vejo que ter comprado esse livro foi um dos meus primeiros passos rumo a maternidade, e não, não estou grávida, e nem pretendo ficar a curto prazo, mas esse é um assunto bastante delicado pra mim. Eu amo ler,comprar livros pra mim não é novidade, mas quando me deparei com a sinopse desse livro, algo dentro de mim se identificou totalmente...
(...)Quando vi as duas listras azuis no teste de gravidez, tive uma certeza: preciso me sentir filha antes de me tornar mãe. Porque uma parte da minha alegria era inventada e, a outra, não era minha.(...)
E é exatamente assim comigo.
Assim como no livro, existem duas Kerlynhas: a filha da minha mãe e eu. E sim, eu sou as duas!
Minha relação com minha mãe é tão complexa que eu não sei se conseguirei me fazer entender... é de um amor imenso, de culpa, de dor, de lágrimas e de sorrisos... é da presença constante de uma falta, é de cuidado e de compaixão.
Minha mãe foi absurdamente carinhosa comigo, e absurdamente ausente também... foi meiga e relapsa, foi incentivadora e distante... como explicar? Não sei, mas hoje sinto a necessidade de seguir em frente e passar a vê-la com outros olhos... com quais? Não sei. Existem muitas dúvidas, existe uma dor que, no fundo, tenho medo de nunca passar, mas eu sei que preciso, pelo menos, cuidar das feridas na tentativa dessa dor diminuir.
Eu demorei - e ainda estou nesse processo - a me ver como "eu mesma" e não como a filha da minha mãe. Deve estar confuso para vocês entenderem, isso tem gerado anos de análise... mas o fato é que minha ligação com minha mãe é assim mesmo, simplesmente confusa!
Vou tentar ser didática, explicar algumas coisas... Minha infância foi relativamente comum, uma casa confortável, dois irmãos mais velhos sempre dispostos a brincar e brigar comigo, mãe com um emprego estável, pai que não sabia demonstrar seu amor pelos filhos e que tinha problemas com o álcool, mas que sempre conseguiu se fazer respeitado e amado por mim e meus irmãos.
O pilar maior e mais forte da família era a minha mãe, mas eis que, aos 14 anos de idade, essa responsabilidade passou a ser minha. O motivo? Ela morreu.
Embora eu fosse uma garota extremamente precoce em tudo, sustentar um lar não estava nos meus planos. Sair com meus amigos, ouvir música, dançar e namorar estavam nos meus planos. Tudo ficou mais difícil. Eu era a única figura feminina na casa e, automaticamente, meu pai e irmãos projetaram em mim uma força que eu não tinha, mas que precisei inventar. Eu não sabia o que fazer, mas fingia saber, e isso foi dando certo. Nunca chorei minhas dores na frente deles, eu era de aço! Mas o que eles não sabiam, é que aço só se tempera na porrada, e no escuro do meu quarto, trancada, eu chorava como uma adolescente, uma simples adolescente.
Minha mãe sempre me dizia que eu conseguiria tudo a que me propusesse, minha mãe me dizia que me amava e me beijava. Minha mãe sentava na minha cama de pernas cruzadas e perguntava, empolgadíssima, como tinha sido o meu encontro com aquele garoto que eu gostava. Minha mãe queria fazer o meu aniversário de 15 anos, e queria me ver dançar no baile de formatura com meu pai. Minha mãe partiu e eu não tive festa de 15 anos, ela também não estará na minha formatura, e nem sabe mais sobre meus amores e desamores.
Entre um estar, e não estar mais, eu amadureci, e nunca dei trabalho. Passei para uma universidade federal aos 16 anos, sempre trabalhei, estudei, nunca usei drogas, namorei sempre caras legais... a filha perfeita por fora, mas vazia por dentro.
Durante muitos anos eu me concentrei nesse vazio, nessa falta, na negligência da minha mãe por não ter se tratado a tempo, nas consequências - terríveis - disso tudo. Coisas que até hoje eu carrego. E toda minha vida foi baseada nessa sensação de desamparo, de não ter alguém para cuidar de mim como se deve, de imaginar como tudo seria diferente se ela estivesse viva... e ao mesmo tempo olhar tudo o que tenho com carinho, com amor... difícil mesmo de explicar, eu sei.
Alguns anos de vida, de terapia e de experiências, hoje me vejo querendo ser mais eu do que a filha da minha mãe. E o que isso muda ? Muda tudo, mas não sei como.
Sei que minha mãe me ama, me ama do jeito dela e me ama como sou, sei de uma energia e proteção que me cerca, e, por hora, isso basta. Minha mãe é minha maior inspiração e meu maior medo... com base nela eu sei o que quero ser e o que não... estranhamente simples assim.
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